Introdução ao tema: psicanálise e música
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Speaker
3 Divãs, a psicanálise, o mundo e o rock'n'roll.
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Speaker
Foi num domingo à noitinha.
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Speaker
Estava eu a caminho de casa, já atrasada para o jantar e no rastilho de um ralhete, que no dia seguinte era dia de escola, quando eu ouvia flutuar na brisa de outono.
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Acertou-me em cheio no coração, em convulsão, porque eu estava apaixonada por um dos girassos da amiga Autorga e não era correspondida.
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Speaker
A sensação de que o entusiasmo se multiplica até ser exponencial, até quase não ser possível existir, onde queres fundir na temperatura morna do pôr do sol ou explodir na rajada que a acompanha.
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Speaker
Na minha terra, na rua Miguel Torga, também viviam as minhas amiguinhas.
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Speaker
Que ano espetacular!
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Speaker
Esse e o seguinte, onde devorámos todos os discos até ficarmos obesos.
Influência cultural da música na juventude
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Estávamos no rescaldo da Guerra do Golfo e vieram os R.E.M., os Messi Vatec, os Guns N' Roses, os Primal Scream, a Chiné do Conor, os Nirvana e, quase a fechar o ano, os U2.
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Speaker
Tenho outra memória.
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Speaker
Uma tarde, cruzei-me com o Hugo, o DJ com o nome da rua, com ganga dos pés à cabeça e o seu Walkman.
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Speaker
Eu, com o meu lenço no cabelo, afastei-os aos coltadores da orelha e perguntei-lhe
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Speaker
O que é que vais ouvir?
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Speaker
Também eu, respondi.
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Speaker
Ouvi-o até gastar a fita da cassete.
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Speaker
Tinha praticamente 13 anos.
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Speaker
O entusiasmo era tanto.
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Speaker
A esperança, gigante.
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Speaker
E estes discos, a desromper uma pop e um rock que, na altura, sentíamos instalados em marasmo.
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Speaker
O disco de hoje já me fez ganhar um jantar no Pinóquio,
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Speaker
Nunca cheguei a reclamá-lo, mas ainda estou a tempo, creio.
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Speaker
Estávamos em 1991, um ano do Caraças para a Música.
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Speaker
O Out of Time ajuda-nos a pensar sobre a condição do amor, do entusiasmo à perda, à aceitação, à libertação, à generosidade, à responsabilidade no encontro.
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Speaker
Os R&M também nos abriram a porta para o mundo à nossa frente.
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Speaker
Hoje, ao ressignificarmos este disco, tentamos encontrar uma porta alternativa.
Cristina Nunes e a expressão emocional
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Speaker
E é o que vamos fazer agora.
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Speaker
Eu, a Patrícia Câmara e a Cristina Nunes, nossa colega e amiga, aqui connosco no Três Divãs.
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Speaker
Cristina, sejas muito bem-vinda.
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Speaker
Tens a palavra, podes apresentar-te.
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Speaker
Bom, depois destas palavras fantásticas que introduzem não só este disco como esta canção, só me resta falar um bocadinho de mim, o que vai ser muito poucochinho, faça tudo o resto que está implícito nisso.
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Speaker
Eu começaria por dizer aqui uma coisa que é
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Speaker
Algo que eu escrevi em janeiro de 94 sobre mim.
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Speaker
Sou terra, sou calor, sou semente, sou amor.
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Speaker
Preciso de ti para crescer aqui, ali, semear o ser.
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Speaker
Sou água, sou filosofia, rio que zagoa na fonte da ironia.
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Speaker
Sou a flor silvestre, eu a flor silvestre.
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Speaker
que cheira e convida a refletir na corrente a opção, a escolha de vida.
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Speaker
Só preciso de um empurrão para fazer da vida um sorriso desenhado às vezes com amargura na face, mesmo assim sorridente.
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Speaker
Em 94 eu dizia isto sobre mim Em coisas que escrevia para aliviar a tensão que havia em mim E isto eu falo aqui da saúde mental E estamos no mês da saúde mental E eu falo aqui Como é... Estamos a dizer que tu és psicanalista Eu sou psicanalista Pronto, que ainda não dissemos E as pessoas têm que saber o que tu és Força Pronto
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Speaker
E no mês da saúde mental, eu acho que é fundamental nós sermos capazes de perceber que este rasgo de expressão emocional, de expressão através da palavra, nos liberta e nos faz exprimir e...
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Speaker
consolidar e ligar as coisas que existem dentro de nós.
00:05:20
Speaker
E por isso eu escrevi este pequeno poema, vamos dizer assim, sobre mim.
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Speaker
Há muito mais a dizer sobre mim.
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Speaker
Eu não vou dizer tudo hoje, porque vocês precisam de saber mais.
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Speaker
Precisam de ficar curiosos para o resto.
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Speaker
E portanto, sobre este tema, esta música, eu vou dizer que quero agradecer-vos a ti, Tereza, a ti, Patrícia, por me desafiarem para pensar sobre isto.
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Speaker
Porque esta música, ou melhor, a assunção de que esta música sou eu, é uma parte de mim considerável, representa um aspecto da minha vida muito importante.
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Speaker
Porque me fez ter consciência de que eu
00:06:24
Speaker
Não sei como vou dizer isto Até me sinto envergonhada É vergonhada É associação livre Eu não sei ouvir música Pela letra Eu ouço música Como faço psicanálise Isto é Pelas entranhas Pelas vixas Pelo coração
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Speaker
E eu percebi isto Quando a Ana Tereza de repente diz assim Escolhe uma música por favor Temos que ter uma música E agora?
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Speaker
O que é que eu faço?
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Speaker
E a primeira música A única música, não foi a primeira Que me apareceu foi esta E agora?
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Speaker
Porquê é que eu sei dizer sobre isto?
00:07:10
Speaker
Eu sei sentir sobre isto Mas não sei dizer sobre isto E então Eu pensei
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Speaker
Eu tomei consciência que não sabia ouvir música em inglês e pensei, agora o que é que eu faço com isto?
00:07:30
Speaker
E, portanto, pesquisei.
00:07:32
Speaker
Pesquisei o meu filho André, um dos quatro.
00:07:38
Speaker
É fantástico porque me sabe sempre pesquisar tudo.
00:07:41
Speaker
Vai buscar sempre tudo a todo lado.
00:07:43
Speaker
E eu disse assim, André, o que é que eu faço agora?
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Speaker
Então, mas tu sabes, tu ouviste isso.
00:07:50
Speaker
Essa era a música que nós ouvíamos.
00:07:51
Speaker
Nós fingíamos que cantávamos em inglês.
00:07:54
Speaker
Eu e a Rita fingíamos que cantávamos em inglês.
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Speaker
No carro tu ias sempre a ouvir isso.
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Speaker
Sempre, sempre, sempre.
00:08:00
Speaker
Eu tinha o meu Fiat, que ele chamava o Cha7, que era Cha0749, acho eu.
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Speaker
E nós íamos sempre a ouvir aquilo.
00:08:12
Speaker
Eu adorava aquela música.
00:08:16
Speaker
E eu pensei, ok, pronto, então é isso.
00:08:20
Speaker
Eu ia ouvir, eu cantava, e era aquilo, eles fingiam que cantavam, e eu também fingia que cantava.
Música e impacto emocional: compreensão além das letras
00:08:26
Speaker
E eu descobri que eu não entendia a letra e que eu não processo a letra das canções.
00:08:35
Speaker
Talvez em português processo, mas não tenho a certeza, mas isso fica para o próximo podcast que a gente faça.
00:08:44
Speaker
Mas, em inglês, era um processo.
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Speaker
Eu sinto a música dentro de mim.
00:08:51
Speaker
E por isso eu escolhi esta música.
00:08:53
Speaker
E, portanto, eu não sei o que é que a música diz.
00:08:57
Speaker
Ou melhor, eu fui investigar e descobri.
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Speaker
E fiquei espantada porque realmente a música diz aquilo que eu senti.
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Speaker
da música sem saber que ela o dizia ela falou do sonho da fantasia, da frustração de o que é que eu faço quando não estou satisfeito comigo e com as coisas à minha volta e de facto eu fantasio eu sonho, eu faço estas coisas todas e fico triste quando não consigo e a música diz isso mesmo e eu fico ainda mais enociasmada
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Speaker
com a possibilidade, não sei se é a possibilidade, com as alternativas que o não saber nos trazem.
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Speaker
Eu acho que isto é uma coisa fantástica.
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Speaker
O não saber sobre...
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Speaker
abre-nos um mundo altamente aberto sobre o não saber sobre, eu vou investigar sobre, eu vou saber sobre o não saber.
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Speaker
E acho fantástico isto nesta música, neste desafio que me foi feito e nesta minha relação que eu construí ao longo de anos
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Speaker
e que continua construída, continua eficaz, continua simbólica, continua com muito sentido para mim nesta música do My Religion, não
Escolha e responsabilidade na saúde mental
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Speaker
A minha convicção.
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Speaker
O que é a minha convicção?
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Speaker
Mesmo que não seja isso, a minha convicção tem valor.
00:10:53
Speaker
Mesmo que não seja igual àquilo que os outros esperam, a minha convicção tem valor.
00:10:59
Speaker
E, portanto, acho que é neste sentido que valorizo todos os investimentos que nós fazemos
00:11:14
Speaker
Além daquilo que é a primeira leitura dos nossos contatos com a vida.
00:11:20
Speaker
Nós temos que dizer esta parte, é por isso que tu és a Presidenta da Associação Portuguesa de Psicanálise e Psicoterapia e Psicanálise.
00:11:25
Speaker
Exatamente, porque é o nome.
00:11:31
Speaker
Uma aula sobre o que é a psicanálise.
00:11:33
Speaker
O encontro a partir de dentro.
00:11:35
Speaker
Vai tendo significados em camadas.
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Speaker
Ou já esta coisa de sentir a partir de dentro.
00:11:40
Speaker
É exatamente aquilo que nos dá saúde.
00:11:43
Speaker
É que não é só as bichas.
00:11:44
Speaker
É partir de dentro para depois poder dar sentido.
00:11:51
Speaker
Bom, não sei o que é de dizer.
00:11:53
Speaker
Dizeste outra coisa, não é?
00:11:55
Speaker
Como é que era aquela frase?
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Speaker
És tu que dizes, já não sei o que é. Tu disseste como é que é?
00:11:59
Speaker
Não saber sobre, o que é que dizia?
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Speaker
Não saber sobre é sobre... Ai, ajuda-me, não sei o que.
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Speaker
Não saber sobre é importantíssimo para aprender sobre.
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Speaker
Porque só a partir do não saber sobre é que a gente aprende sobre.
00:12:13
Speaker
Mas o não saber sobre é saber sobre.
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Speaker
É esse o que é. Exato.
00:12:16
Speaker
Como é que eu estava sendo...
00:12:18
Speaker
Pronto, eu não sei se é ser presidente, não é?
00:12:24
Speaker
É, nós não temos isto assim, ok.
00:12:29
Speaker
Mas acho que é ser, é saber ler o simbólico da coisa.
00:12:39
Speaker
É saber ler que alternativas existem.
00:12:43
Speaker
é saber fazer uma coisa que eu recomendo muito aos meus pacientes, que é a construção simbólica da contabilidade.
00:12:59
Speaker
Isto é, eu tenho 10 alternativas, ou 8 ou 5,
00:13:06
Speaker
eu vou contabilizar em cada uma delas os custos e os benefícios para mim, do ponto de vista simbólico, do ponto de vista da dor, do ponto de vista da ansiedade, do ponto de vista da emoção, do ponto de vista da satisfação.
00:13:26
Speaker
Isto é muito importante.
00:13:28
Speaker
Eu costumo dizer que isto é a construção simbólica, o símbolo, digamos assim, da... Desculpem lá, mas agora está-me a dar aqui uma paragem.
00:13:45
Speaker
Estou muito emocionada por estar aqui neste lugar.
00:13:49
Speaker
A construção do simbólico...
00:13:57
Speaker
Quais são os custos e benefícios de cada uma das alternativas que nos colocam?
00:14:04
Speaker
E saúde mental é saber avaliar isso.
00:14:09
Speaker
Qual é o custo disto e daquilo?
00:14:14
Speaker
E escolher aquilo que nos é mais saudável, que nos provoca menos dor, que nos provoca mais satisfação.
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Speaker
Lá está a ser argumentada escolher.
00:14:29
Speaker
Pode carretar dor.
00:14:32
Speaker
Porque a escolha pode carretar dor, mas a consciência de que isso acontece.
00:14:38
Speaker
Por oposição à não escolha de nada e à queixa permanente e à aniquilação do outro pela não escolha.
00:14:55
Speaker
Porque quando há uma... Se estamos todos em relação e se houver uma não escolha ou se a escolha for totalitária, alguém ou alguma coisa ficará aniquilada.
00:15:07
Speaker
Por isso sim, isso é a saúde mental.
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Speaker
É poder escolher e, portanto, temos a saúde mental com ligação direta à liberdade, que é precisamente o poder escolher.
00:15:16
Speaker
com noção da responsabilidade dessa escolha do que se escolhe e do que se põe de parte exatamente, ou seja da perda
00:15:27
Speaker
Patrícia Sim, mas sabe-se o que é que é estar má-pido se levar para outro sítio?
00:15:31
Speaker
Não, não, não, isto não, leva, leva Não é isto É porque eu acho que nós temos, como acho que andamos todos tão esmagados com coisas tão duras Eu percebo o que tu dizia, e não a elaboração desse lugar da perda é claro que nos leva para sítios tremendos E era o resumo de outra forma do que a Cristina acabou de dizer
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Speaker
Mas eu me peço esta ideia do out of time Não é?
00:15:52
Speaker
Porque eu acho que a Cristina deu aqui A personificaste aqui Este sítio que nós tentamos fazer Na psicanálise O sair do tempo para encontrar o tempo E o que tu disseste
00:16:04
Speaker
não sei com vergonha do quê, porque é mesmo o sítio despojado de qualquer pré-conceção que nos permite chegar verdadeiramente ao sítio de encontro interno, não é?
00:16:12
Speaker
Portanto, quando eu me permito sair do tempo para mergulhar numa coisa que não sei bem o quê e daí construir qualquer coisa, sem medo desse lugar de vulnerabilização daquilo que estou a ouvir, é que é possível partir para um olhar de entusiasmo para a vida e construir lugares de saúde, não é?
00:16:27
Speaker
E é isso que nós queremos, nós queremos resgatar este sítio de...
00:16:33
Speaker
Isso tu disseste tão livremente, não é?
00:16:35
Speaker
Olha, eu ouvi, aquilo teve um sentido para mim, eu nem sabia qual era.
00:16:38
Speaker
E depois, quando vocês me disseram isto, eu encontrei um sentido em cima do sentido que até eu encontro do sentido original.
00:16:44
Speaker
Mas são estes, e é muito diferente da impulsividade que nós estamos a assistir, porque é preciso definir também, ajuda-me, é preciso...
00:16:51
Speaker
Separar essas duas ideias, não é?
00:16:52
Speaker
Porque uma coisa é o gesto espontâneo que vem deste encontro interno com qualquer coisa que tem a ver com a vulnerabilidade.
00:16:58
Speaker
A impossibilidade é exatamente o oposto disto, no limite a não escolha que tu estavas a dizer, não é?
00:17:03
Speaker
Que é validar a impossibilidade de entrega como um sítio da ação em busca de sentido, mas é a aniquilação do sentido.
00:17:12
Speaker
Só para puxar para o Out of Time, eu adoro o título do Out of Time.
00:17:15
Speaker
Out of Time, sei o que eu tenho que vos dizer, para mim eram os rem.
00:17:19
Speaker
Foi assim que o meu pai me apresentou.
00:17:23
Speaker
Para mim e para os meus filhos também foi os rem.
00:17:27
Speaker
Vamos ouvir os Réme outra vez.
00:17:30
Speaker
Eles não me lembram disso mesmo.
00:17:31
Speaker
Eu acho que é R.E.M.
00:17:34
Speaker
Mas é incrível, porque os meus primos todos diziam Réme.
00:17:41
Speaker
Mas, se vocês sabem que este álbum eu já ganhei um almoço com uma aposta por causa do nome deste álbum e da saída deste álbum no Pinóquio.
Música, identidade pessoal e comunicação simbólica
00:17:52
Speaker
Eu ainda não o reivindiquei.
00:17:56
Speaker
Eu ainda não a reivindiquei, mas se tu me estives a ouvir, e vais ouvir com certeza, tu debes-me um almoço no Pinóquio, um jantar, e eu vou a reivindicá-lo.
00:18:06
Speaker
Patrícia e eu estamos lá contigo.
00:18:08
Speaker
Pronto, então, já não pagas um, vais ter que pagar três.
00:18:14
Speaker
Então, mas isto já tem uns anos esta aposta, já tem uns anos, mas vou resgatá-la, é verdade.
00:18:23
Speaker
Sim, e dentro do, portanto, esta canção Losing My Religion, a Cristina estava a dizer, estava a levá-la aqui no sentido que eu acho que muita gente leva, que tem a ver com perder a minha fé, não é?
00:18:38
Speaker
Esta coisa do perder a minha fé.
00:18:42
Speaker
Sim, mas o Mike Stripe explicou uma vez que isto tem esta expressão, eu agora não a sei explicar, mas esta expressão, porque isto me está tudo a ocorrer agora, não me preparei.
00:18:57
Speaker
Mas ele disse uma vez que esta expressão E assumo porque até como viram na introdução Porque há uma expressão que eu penso que é do Sul da América Que é mesmo Losing my religion Que tem mesmo a ver com esta coisa da incapacidade de comunicar o amor pelo outro Portanto That's me in the corner É um bocadinho isto que é A beira de explosão
00:19:26
Speaker
que não consegue comunicar o amor e está na perda desse amor também, por não conseguir comunicar a forma como se sente.
00:19:33
Speaker
Pronto, eu acho que isto é também significativo nesta canção.
00:19:39
Speaker
E não se conseguia fazer ouvir, não é?
00:19:44
Speaker
E não se conseguir fazer ouvir e não encontrar as palavras para se fazer ouvir.
00:19:51
Speaker
Eu acho que é também uma dificuldade dos dias de hoje, principalmente.
00:19:59
Speaker
pela ausência da capacidade de simbolizar e da função simbólica e também por esta linearidade que se instalou e que está a tirar o vocabulário às pessoas e esta ligação entre o sentir e o pensar que estávamos aqui a falar que só a linguagem simbólica também pode ajudar e que está a transformar
00:20:30
Speaker
Ou se está a transformar os seres humanos em seres perversos ou em seres que nem sequer conseguem explicar aquilo que sentem, que é muito complicado.
00:20:46
Speaker
conforme saibam ou não, expressar nessa linguagem simbólica, não é?
00:20:56
Speaker
E a Patrícia estava há bocado a falar na questão do estou aqui ao lado, o que é que significava isso?
00:21:03
Speaker
Eu acho que o estou aqui ao lado é, estou aqui ao lado, eu quero expressar, não estou a conseguir, mas quero...
00:21:09
Speaker
Não desisto, estou aqui, não é?
00:21:11
Speaker
E acho que isso é muito importante, nós não desistirmos, mas a linguagem simbólica é efetivamente aquilo que nos permite representar as coisas que nos apoquentam, que nos entusiasmam, que nos afetam, que nos põem para baixo e...
00:21:37
Speaker
encontrar um mecanismo que nos faça contactar com a emoção, com aquilo que eu dizia há bocado, não é?
00:21:49
Speaker
Que no fundo é as víceras, a emoção visceral, porque na essência nós somos viscerais, na essência nós somos
00:22:01
Speaker
Animais sem pensamento.
00:22:03
Speaker
O pensamento é qualquer coisa conquistada mais tarde que transforma a sensação, a emoção, como uma espécie de capacete que apanha...
00:22:20
Speaker
que apanha esse sentimento visceral e que o conduz para um lugar transformável em construção.
00:22:31
Speaker
Isto não é nada fácil.
00:22:34
Speaker
O que é verdade é que é isto que nós estamos a viver todos os dias.
00:22:39
Speaker
E das duas uma, ou nós vamos atrás da parte visceral e vamos combater e dizer, a vizinha diz que eu fiz não sei o quê, ela é horrível e não sei o quê.
00:22:49
Speaker
E nós temos este exemplo de uma forma mais transformada,
00:22:56
Speaker
todos os dias aí, nomeadamente no Chega, nas coisas agora da política, não é?
00:23:06
Speaker
Ou então temos alguém que compreende, que integra essa sensação, que dá um sentido a essa sensação e que transforma isso num pensamento integrado
00:23:25
Speaker
que integra a sensação emocional e que integra aquilo que dá vontade de fazer e aquilo que nós podemos escolher fazer e eu acho que isto em saúde mental é uma coisa fantástica mas é tanto mais fantástica quanto mais difícil mas é o que sustenta a saúde é o que sustenta a saúde isto é o que sustenta a saúde isso é o que sustenta a saúde mental
00:23:53
Speaker
E ainda vou dizer outra para completar um bocadinho isto, para acrescentar só o que é. O que tu disseste, que é, portanto, esta capacidade de pensar que nos é fornecida através da aquisição da função simbólica, não é?
00:24:09
Speaker
Este pensamento que vai ajudar a integrar a sensação visceral...
00:24:15
Speaker
e que nós estamos a ver olhos nus que há uma grande há muita gente com incapacidade de o fazer ou seja, dito de outra forma que está a aumentar o nível de que as personalidades mais primárias com dificuldades a nível mais primário estão a aumentar porque as pessoas estão a deixar de ter essa função simbólica que lhes permita pensar e integrar
00:24:42
Speaker
Depois ainda temos uma outra coisa agora, que nem sequer há essa visceralidade.
00:24:51
Speaker
É porque a visceralidade ainda te permite sentir.
00:24:55
Speaker
Tu ouves o Losing My Religion e dizes, eu não percebo nada da letra, mas há qualquer coisa.
00:25:00
Speaker
Isto é, eu identifico-me com isto.
00:25:03
Speaker
Eu identifico-me com isto.
00:25:04
Speaker
E depois fazes uma aprendizagem da letra, lá está.
00:25:08
Speaker
Vais a uma linguagem que te permite, entretanto, tomar outro conhecimento em que tu, a conjunção das duas coisas, vais integrar.
00:25:18
Speaker
Mas também se passa muito isto hoje em dia, que é nem sequer existir essa visceralidade, ou seja, em que tu ouves o out of time, ouves o losing my religion e que não te diz nada.
Desafios da comunicação moderna e a saúde mental
00:25:34
Speaker
E como não te diz absolutamente nada, mas tu sabes que há a quem diga, tu vais fazer uma mimetização daquilo que os outros dizem sobre o Losing My Religion e é isso que tu vais gritar ao mundo.
00:25:50
Speaker
que é tão ou mais assustador ainda do que gritar a visceralidade porque de facto temos cada vez mais psicopatia não temos só estados border ou narcísicos temos psicopatia com fartura pronto e era isto que eu queria dizer
00:26:09
Speaker
que vai ao encontro dessa ausência de tudo, não é?
00:26:13
Speaker
A psicopatia é mesmo a ausência, nem sequer a visceralidade, que é qualquer coisa assustadora.
00:26:19
Speaker
É verdade, obrigada por esta complementaridade e até passava a Patrícia para poder aqui acrescentar alguma coisa nesta complexidade da abordagem.
00:26:35
Speaker
Pois não sei, porque eu estava a pensar na Vixaragela de outra maneira e portanto estava aqui a tentar integrar o que vocês estavam a dizer, porque me parece, acho que sim, por isso é que eu estava a tentar dizer aquilo há bocadinho entre o que é primário e o que é primitivo, no fundo, não é?
00:26:49
Speaker
E o que nós estamos a falar atualmente é que não existe primitivo, existe só primário.
00:26:54
Speaker
Agora, não sei se não estão lá as bísteras, ou seja, até me parece que muitas vezes estas coisas mais de acting até são as bísteras sem tradução em nada, não é?
00:27:01
Speaker
Porque isso acho que há um lugar que tem a ver com a entrega que é muito da vulnerabilização, não é?
00:27:06
Speaker
A vulnerabilização na relação com o outro, que é isto que é inacessível na psicopatia, não é?
00:27:10
Speaker
Eu percebo que está a dizer das bísteras.
00:27:12
Speaker
mas estava a pensar que às vezes a sensação que eu tenho é quase como se fossem só as víxeras a falar percebe?
00:27:16
Speaker
na psicopatia está tão primária a própria psicopatia deixa-me lá pôr o coisa um bocado a brincar mas a verdade é que nem a psicopatia tem classe não é?
00:27:21
Speaker
a psicopatia está completamente primária as víxeras falam e está tudo bem falam sem mais nada são assim coisas em cru eu percebo que estás a dizer não sentir mas eu acho francamente ou eu acho que o que estamos a viver agora é isto do aplanamento da capacidade de pensar que estavas a falar não era?
00:27:39
Speaker
da incapacidade de criar coisas simbólicas
00:27:41
Speaker
Que é mesmo esta sensação, não é?
00:27:43
Speaker
Que aquilo que é primitivo nunca pode acontecer sequer porque o que é primário toma conta da possibilidade de se transformar em qualquer coisa.
00:27:51
Speaker
Espera aí, tu disseste uma coisa que queria dizer e eu perdi-me.
00:27:56
Speaker
Foste tu, agora mesmo.
00:27:58
Speaker
Que eu queria dizer, já sei da capacidade de pensar Tenho andado a pensar nisso também Porque Será que há um ataque ao pensamento permanente E nós sabemos que ele existe, não é?
00:28:07
Speaker
Há um ataque ao pensamento, ele está acontecendo há imenso tempo Está cada vez pior, cada vez com mais força Mas também tem a ver com a intoxicação permanente, não é?
00:28:14
Speaker
Porque a capacidade de gestão E com o poder que é dado Mas repara, nós não conseguimos digerir Nós não temos tempo de gestão Nada
00:28:22
Speaker
porque a velocidade das coisas, a intoxicação permanente com elas, nem sequer nos dá espaço para isso.
00:28:27
Speaker
Portanto, as partes primárias estão cada vez mais assenhadas, não é?
00:28:30
Speaker
O que tu tens é um conjunto de assanhamentos sem tradução.
00:28:34
Speaker
E enquanto tivermos este nível de intoxicação, vai ser mesmo difícil fazer outra vez resgatar os sítios que nos dão vida, não é?
00:28:40
Speaker
Que é a cabeça de contemplar.
00:28:41
Speaker
A capacidade de ingerir, pegando os REM, naquilo que estávamos a dizer, até da capacidade de dormir, do sonhar, sonhar, a possibilidade de sonhar está completamente comprometida pela intoxicação.
00:28:52
Speaker
Até os sonhos, e hoje tenho sentido isso mesmo às vezes, até os sonhos perderam a narrativa, não é?
00:28:58
Speaker
Muitas vezes se sente isto, como voltar a introduzir uma narrativa dentro de um sonho.
00:29:01
Speaker
Os sonhos aparecem assim coisas brutais, cruas, sem grandes... não sei se vocês sentem isto, mas...
00:29:07
Speaker
Sem grandes construções de narrativas, sem grandes símbolos.
00:29:10
Speaker
E possibilidades de transformação.
00:29:12
Speaker
Quanto mais o outro sítio que também tem sido super atacado, nós já falámos várias vezes aqui também, que é o sonhar acordado.
00:29:17
Speaker
É porque foi atacado durante não sei quanto tempo.
00:29:20
Speaker
Portanto, é muito difícil, sem espaço para sonhar acordado, sem espaço para sonhar à noite, sem possibilidade de digerir, criar uma linguagem que não seja linear.
00:29:30
Speaker
E portanto, a visceralidade agora no sentido negativo vai-se instalando completamente.
00:29:36
Speaker
Volto a dizer, nós tivemos e estamos a ter e continuamos a ter um silenciamento total de uma geração inteira com déficit de atenção.
00:29:43
Speaker
Quer dizer, o que é que é isso?
00:29:45
Speaker
Embaralha-se tudo.
00:29:46
Speaker
Inatenção, desatenção, inquietação.
00:29:50
Speaker
De repente todos os dias são maus, a não ser que seja a hiperfocalização num estímulo que ninguém sabe muito mais para o que é que serve, não é?
00:29:56
Speaker
Agora, quando é que se volta a dizer que a saúde mental depende da capacidade de não estar atento?
00:30:02
Speaker
Isto é que nós devemos estar a dizer, acho eu e aos berros, não estás atento, ótimo, se calhar estás num sítio de saúde mental.
00:30:07
Speaker
Ou seja, por isto ao contrário, temos que começar a pôr ao contrário, é virar as vítreas ao contrário.
00:30:11
Speaker
Mas ajuda-me, como é que se diz?
00:30:16
Speaker
Pois, mas não é virar isso ao contrário, não é virar ao contrário, é pôr-me a sítia certa.
00:30:27
Speaker
Porque é por no sítio certo, ou seja, se há um sítio certo, não é?
00:30:33
Speaker
O sítio certo será o sítio onde haverá uma maior capacidade de estar com a dor,
00:30:46
Speaker
Conviver com ela, ou uma maior capacidade de conviver com o prazer, ou uma maior capacidade de conviver com a dificuldade, ou uma maior capacidade de conviver com o sucesso.
00:30:58
Speaker
Pronto, é. Mas, e isso...
00:31:02
Speaker
É que esse é o lugar.
00:31:04
Speaker
Eu não sei se é o certo ou se é o errado, mas esse é o lugar.
00:31:06
Speaker
Ou é o lugar onde se pode respirar.
00:31:09
Speaker
É o lugar que é preciso agora.
00:31:10
Speaker
Eu acho que nós vamos transitando entre as coisas, não é?
00:31:13
Speaker
Neste momento é mesmo importante transitar para o lugar da desatenção.
00:31:17
Speaker
Da inatenção, da desatenção, da possibilidade de estar... É preciso transitar para este lugar.
00:31:20
Speaker
Se ele ficar em excesso, é preciso tirar um bocadinho outra vez.
00:31:23
Speaker
O que está a acontecer é que estamos fixados num ponto, não é?
00:31:26
Speaker
Que não nos permite andar a transitar por tudo aquilo que é necessário para a elaboração.
00:31:29
Speaker
Isso é muito interessante.
00:31:32
Speaker
Até nas neurociências e tudo isso, não é?
00:31:35
Speaker
Esta questão do excesso.
00:31:38
Speaker
Se nós temos em excesso, temos que encontrar alternativas para diminuir a estimulação em excesso, não é?
00:31:45
Speaker
E às vezes nós não pensamos sobre isso.
00:31:48
Speaker
Nós pensamos... Bom, agora estamos a levar para outro lugar, que não é tanto de uma psicanálise mais do sentir, mas é como uma psicanálise das reproduções neurológicas dos efeitos das vivências, não é?
00:32:08
Speaker
Portanto, eu acho também muito importante nós darmos lugar...
00:32:14
Speaker
a este espaço de qual é o efeito das reproduções, das vivências, das experiências e como é que nós podemos, a partir daí, criar, ou melhor, estudar, analisar as alternativas possíveis
00:32:34
Speaker
para poder escolher aquelas que fazem mais sentido ou que são mais ou que têm menos não é que são mais é que têm menos efeitos negativos e isto eu acho que é muito importante e muitas vezes nós não estamos aqui canalizados para pensar isto nós estamos canalizados agora está a acontecer isto vamos já resolver isto e a seguir vamos resolver a seguir não, nós temos que pensar é
00:33:04
Speaker
O que é que está a fazer com que isto esteja a acontecer?
00:33:08
Speaker
Como é que nós podemos, que alternativas existem face a isto?
00:33:12
Speaker
Quais são as alternativas que têm menos custos e mais benefícios?
00:33:17
Speaker
E o que é que nós podemos escolher face a isso?
00:33:20
Speaker
E eu acho que isto, muitas vezes, nós não temos condições de pensar isto, estamos a...
00:33:27
Speaker
Afogeados Com a necessidade de reagir Ai, ai, ai, estou aflito, estou aflito Agora faço isto A palavra que escolheste é isso mesmo É uma incontinência permanente Eu não disse incontinência Mas adoro incontinência É isso mesmo Incontinência permanente Patrícia Tu gostas muito do Shining Happy People Pois é, pois gosto
00:33:57
Speaker
Só para voltar aqui um bocadinho, temos sempre dentro de disco.
00:34:00
Speaker
Mas eu estou a com a Cristina, porque como é um...
00:34:04
Speaker
um disco que é a mesma verdade, eu ouvi a primeira vez no carro com o meu pai e com a Sofia e a Bucharin' Happy People era a música que nós ouvíamos assim mais mas era realmente uma alegria triste havia sempre este sítio, estes sítios eram-nos permitidos com muita tranquilidade mas eu nem tinha dado conta disso, hoje quando estávamos a falar sobre o álbum a nossa colega Gabriela Alonso disse-me pois que é uma música de uma alegria muito triste
00:34:33
Speaker
E eu pensei, pois é, nunca tinha conseguido pôr isto num lugar.
00:34:37
Speaker
Portanto, para mim, como veias, é sempre o mesmo lugar, Ana Teresa.
00:34:40
Speaker
Não sei, por mais discos que surjam.
00:34:49
Speaker
Mas eu posso te pôr como é que eu achava que era.
00:34:51
Speaker
Como é que eu sentia que era.
00:34:53
Speaker
Que era esta ideia, não é?
00:34:54
Speaker
De haver um brilho qualquer que surge, da possibilidade de sentir as coisas por inteiro.
00:34:58
Speaker
Portanto, havia um shining, uma coisa que acontecia da partilha daquele lugar, do prazer de estar em conjunto.
00:35:04
Speaker
Era assim que eu via, mas eu ia no carro, eu via muito contente, a cantar.
00:35:07
Speaker
É gíteo, mas era no carro, está tudo a questão.
00:35:08
Speaker
em movimento, dá movimento esta música, dá-me sempre só movimento sim, sim, e era pronto, e ainda bem que tu sentias assim porque é por isso que estamos aqui hoje a falar disso tu sentias-te de outra forma, não estávias aqui
00:35:24
Speaker
Completamente Mas posso tornar a coisa mais erudita se quiseres Não, não, no portanto está ótimo Eu gostaria Ai Cristina quer Não me faças isso Não estou a brincar Não acho que era isso E eu não quero dizer a palavra não encolhe outra vez Senão temos que mudar o nome do podcast
00:35:48
Speaker
A Patrícia diz sempre a palavra melancolia em todos os episódios.
00:35:53
Speaker
A melancolia é um aspecto da nossa vida primordial.
00:36:00
Speaker
E eu acho que é essencial para dar sentido a todas as experiências que nos acontecem no resto da nossa vida.
00:36:09
Speaker
E, portanto, eu percebo e concordo com a Patrícia que melancolia é sempre uma palavra primordial porque, a partir daí, é que nós interpretamos as experiências que vamos ter a seguir.
Música como resposta a pressões emocionais e sociais
00:36:23
Speaker
E eu acho que é tão fantástico a capacidade que nós temos de interpretar as experiências que temos, que vamos tendo ao longo da vida, ainda que tenham sempre uma ligação, tenham sempre um fio condutor à melancolia, mas têm outros fios condutores que nos vão dizendo, ah, mas tu sentiste isto, mas tu fizeste isto.
00:36:47
Speaker
Eu acho que esta experiência primordial à melancolia é efetivamente também uma experiência transformacional ou da transformação da mudança
00:37:01
Speaker
para o crescimento, que estamos sempre a acrescentar, cada vez que temos uma experiência nova.
00:37:07
Speaker
Estava só a pensar, e vai ao encontro daquele cara, a Três Aziena, da questão da escolha, da perda da escolha, mas estava a me lembrar também outra coisa da música, que depois disso foi mais tarde, não é?
00:37:16
Speaker
Que era, no fundo, o cunho também de ironizar...
00:37:19
Speaker
A ideia também do Shining Happy People ser também ao mesmo tempo uma ironia com a parte toda das questões de, na verdade, viver enganadamente feliz.
00:37:29
Speaker
Era um bocadinho isto, não é?
00:37:30
Speaker
Também tinha este sítio de quase false self, não é?
00:37:33
Speaker
Estás enganada, ajuda-me, não consigo.
00:37:38
Speaker
mas é uma coisa a gravar é pior que enganado é falsificado é equivocado é qualquer coisa do fingimento não é vou-te dar uma coisa que não é o que tu queres mas é qualquer coisa que substitui aquilo era quase o videoclipe este álbum tem muitos videoclipes porque foi um sucesso fizeram imensos videoclipes das músicas quase todas
00:38:06
Speaker
E eu estava a ver a Kate Pearson e o Mike Stripe todos contentes a dançar e aquilo era até uma coisa de muita euforia, o videoclipe.
00:38:19
Speaker
mas é uma canção que cai aqui no meio de todas as outras e todas as outras também contam com dupla valência, porque dupla valência neste sentido.
00:38:29
Speaker
Tanto as canções distantes que falam de amor e do apaixonar-se ou do viver um amor, também falam do amor e da desilusão e da perda e da incapacidade de ser vivido.
00:38:39
Speaker
E, portanto, isto é muito simbólico até para aquilo que estamos a viver hoje e para os panoramas...
00:38:46
Speaker
do horror que estamos a ver, panoramas não, sim, que estamos a ver o horror em direto para a televisão e a possibilidade até de haver ainda mais horror.
00:38:57
Speaker
E então é um bocadinho isto também, não é?
00:39:00
Speaker
Porque eu acho que tem o outro lado, também podemos pensar, que é a música que rasga a melancolia, porque é como se viesse uma resposta maníaca.
00:39:10
Speaker
para a luta destes sítios horrorosos é que é a música do disco que vem mais com esta onda maníaca de vamos todos ser felizes deem as mãos vivam o amor entreguem-se ao outro permitam que o outro goste de vocês quase como uma resposta assistiva para toda a melancolia que há no disco mas o mesmo que estamos a precisar agora
00:39:30
Speaker
Também acho que não é excessiva Só por dizer isto Isto é só Eu gosto da canção Mas nunca foi uma canção que eu suportasse muito bem É verdade Por isso eu gosto muito mais Mas é outra coisa Porque eu gosto da minha canção Losing My Religion É inequivocamente a melhor canção Para nós Nós gostamos todas muito desta canção Mas o Low
00:40:01
Speaker
Tenho, eu adoro o low, é espetacular, e que vai a um sítio de desilusão para a possibilidade de um crescer outra vez e depois o sítio... Mas é um suprimento maior.
00:40:09
Speaker
É, é, é, que temos que aguentar o sítio da perda, eu adoro o low e depois por tudo, não é o ritmo da guitarra, tudo é pronto.
00:40:18
Speaker
Mas eu adorava essa ideia do Shining Happy People ser uma solução maníaca.
00:40:22
Speaker
É muito boa, isto que ela acabou de dizer.
00:40:24
Speaker
Dentro do disco...
00:40:25
Speaker
porque tu ouvires o disco não é?
00:40:27
Speaker
dentro do disco é assim porque tu ouvires o Shining Happy People é uma canção de felicidade e que não tem que ser maníaca mas dentro do disco eu acho que foi o sítio onde eles encontraram para sustentar a própria melancolia do disco está excelente
00:40:44
Speaker
Mas é verdade, porque dentro do disco, eu acho que eles encontraram várias portas de... Como é que eu digo?
00:40:55
Speaker
Como é que diz o excesso?
00:40:57
Speaker
Libertação do excesso.
00:40:58
Speaker
De libertação do excesso de pressão.
00:41:01
Speaker
E uma é o Usa e Mãe Relígio.
00:41:04
Speaker
Eles conseguem aí...
00:41:10
Speaker
Colocar a consciência da insatisfação, a consciência da frustração, da desilusão com a relação com o outro, do desejo da relação com o outro ser suficiente e depois da libertação disso, ok, não vai ser, mas pronto, vamos conseguir…
00:41:32
Speaker
E eu acho que eles conseguem transgredir ou transportar, mais que transgredir, mas se calhar em transgredir, não é por acaso que a gente escolhe as palavras.
00:41:42
Speaker
Eles transgridem para as outras canções o potencial que ficou por viver emocionalmente na canção primeira.
00:41:59
Speaker
E eles transgridem para aí e vão viver depois isso que tu acabaste de dizer, que eu acho que é fantástico, que é uma necessidade de viver qualquer coisa a um nível simbólico, que tem uma pressão que é mais do que simbólica, que é...
00:42:16
Speaker
eu não aguento isto, eu não sei lidar com isto, isto é muito importante para mim, isto é muito significativo para mim, mas eu não aguento isto, e depois eles conseguem transportar isso.
00:42:28
Speaker
E eu acho que é esta transgressão e transmissão sucedânea que vai permitir, de facto, libertar e esclarecer
00:42:47
Speaker
Esta tensão que não era suportável com estas coisas todas em conjunto, não é?
00:42:54
Speaker
É uma das coisas que assim... Agora, eu não consigo falar isto porque eu tenho que voltar aqui ao início.
00:43:02
Speaker
porque é mesmo para mim foi mesmo muito importante este disco, é mesmo um dos meus discos favoritos, e atenção é que é incrível porque não é de todo, quer dizer não é o meu rock favorito, este tipo de eu gosto é mesmo, há um carinho que eu tenho associado às minhas descobertas aos R&M, porque eles foram mesmo foi dos primeiros desta gente toda desde os R&M, os Messi e Vateco, os Nirvana com o Nevermind
00:43:31
Speaker
Os Guns and Roses Call Losing My Illusion Até a Marisa Monte neste ano Foi o ano em que ela lançou o mais Este ano de 1991 Que depois transbordou para 92 Que andámos todos por aqui 91, 92 a digerir Fez de nós obesos Nesta coisa espetacular De ter coisas mesmo de grande qualidade Que estavam a abrir a porta Para um sítio de esperança Onde todos achávamos que ia ser melhor E foi...
00:44:02
Speaker
Não, não, e foi, é verdade, é verdade, o que a Patrícia está a dizer é muito verdade, porque nós também temos estado aqui mergulhados numa ausência de esperança, ou até como a Simone Bourvard dizia, não há nada pior do que assistirmos à agonia da esperança,
Esperança, desespero e amadurecimento emocional
00:44:18
Speaker
Que é o que nós temos estado a sentir, acho que posso falar aqui em nome de todas.
00:44:25
Speaker
E de facto isto foi um tempo mesmo muito bom em que estas criações, e trouxe, atenção, o que nós estamos a sentir agora,
00:44:43
Speaker
apanham-nos a todos um bocadinho de surpresa ou seja, nós podemos ressignificar estes discos todos porque estes discos já falam disto que nós estamos a sentir agora nada disto é novo nada disto é novo e se recuarmos nos discos de 60 e de 50 já falavam também muito disto que se fala agora ou seja, o que é a desilusão é a falta de capacidade de aprendizagem que o ser humano demonstra constantemente
00:45:11
Speaker
Essa é que é a maior desilusão da humanidade, parece-me, que é o não conseguirmos aprender e estarmos constantemente neste ciclo em que acabamos de uma forma muito primária a tentarmos aniquilar uns aos outros pela impossibilidade de estarmos com toda a diversidade no mesmo lugar.
00:45:33
Speaker
E isto é uma coisa que em 1991, eu confesso que nunca imaginaria estar a ver.
00:45:42
Speaker
Eu lia nos livros de história, ouvia as histórias dos pais, dos avós, dos primos, dos tios, dos vizinhos, sobre lugares horrorosos em que o totalitarismo impera, mas eu não estava mesmo, embora tivesse sempre a salvaguarda de que o ser humano pode ser assim, mas tive sempre a experiência que isto poderia não acontecer.
00:46:09
Speaker
No entanto, estamos completamente estupidificados e voltamos a ter essa estupidez crua e nua em cima da mesa.
00:46:23
Speaker
Com disfarces, o que é pior.
00:46:28
Speaker
Mas eu acho que este lugar hoje aqui encontrado entre nós as três nos permitiu perceber que esses disfarces nos põem no lugar...
00:46:43
Speaker
da pergaria, nos põem no lugar da repetição, nos põem no lugar da... o que é que nós podemos fazer para lutar contra isto?
00:46:57
Speaker
da interrogação sobre isso.
00:46:59
Speaker
E acho que isso é a coisa mais importante, se calhar, deste lugar de partilha que nós tivemos aqui hoje.
00:47:06
Speaker
É o que é que nós podemos fazer para melhorar isto?
00:47:11
Speaker
O que é que nós podemos fazer para impedir que isto se instale num lugar de demência, de insaúde, de doença?
00:47:25
Speaker
mental, doença física, doença psicosomática.
00:47:30
Speaker
E eu acho que isto foi muito importante para podermos identificar onde é que temos que ir investigar para não permitir que se instalam nesse lugar.
00:47:42
Speaker
Eu não sei se concordam comigo, mas isto é a leitura que eu faço, de facto, e que nos dá
00:47:49
Speaker
A esperança também.
00:47:51
Speaker
E eu acho que a esperança, nós precisamos muito da esperança para o futuro.
00:47:55
Speaker
E acho que temos razões para ter esperança, mas temos que trabalhar muito para não deixar que estes lugares que podem ser de esperança se transformem em lugares de repetição.
00:48:10
Speaker
É verdade e toda a tua... Tudo isto que tu disseste agora, Cristina, é a esperança aí no teu discurso, ou seja, é mesmo um discurso esperançoso.
00:48:24
Speaker
Tu acreditares que há sítios onde podemos investigar para não deixarmos ficar a estupidez neste sítio que nos leva à demência.
00:48:34
Speaker
eu posso ser um bocadinho menos otimista do que tu e olha que eu sou aquela que diz aqui na mesa que a perversão pode ter uma semente que a Patrícia Câmara diz sempre olha que tu estás a ser muito otimista mas eu tenho que dizer aqui uma coisa eu vou pôr isto aqui de outra forma não, vou pôr só isto aqui desta forma como às vezes ponho que é como é que tu tens um bebê de 3 meses no colo
00:49:06
Speaker
e tu ouves o teu bebê a gritar desesperadamente está num choro aqueles chores de gritos que os bebês fazem ou tu tens a sensibilidade como mãe suficiente para perceber aquilo ou podes não conseguir ter essa sensibilidade e muitas vezes não se tem e não se consegue perceber o choro daquele bebê
00:49:33
Speaker
E fica-se numa impotência desgraçada.
00:49:35
Speaker
O que é que se faz àquilo?
00:49:37
Speaker
O que é que se faz àquele choro?
00:49:38
Speaker
O que é que se faz àquele bebê?
00:49:40
Speaker
E muitas vezes a única solução que há, às vezes damos cola ao bebê e o bebê é calmo, não é?
00:49:46
Speaker
Ou conseguimos descobrir a necessidade daquele bebê e satisfazemos essa necessidade e o bebê é calmo.
00:49:53
Speaker
Ou então, muitas vezes, o bebê acaba por se cansar de chorar.
00:49:59
Speaker
E a questão é que o que está a acontecer é isto, é que nós temos neste momento milhares de crianças com 1,80m a gritar.
00:50:12
Speaker
E crianças com 1,80m a gritar porque não têm uma necessidade satisfeita, nós não podemos dar cola a essas crianças.
00:50:21
Speaker
Nós não podemos dar cola a uma criança de 1,80m que está prestes a aniquilar o mundo.
00:50:29
Speaker
nós não podemos dar cola ou seja, há uma coisa que nós podemos fazer que é perceber como é que estes homens imaturos chegaram cresceram dentro desta imaturidade e o que é que se pode fazer na primeira infância para que isto não aconteça outra coisa é termos estas bestas ao cimo da terra a tratarem o outro como se fossem mães e pais quando não são
00:50:58
Speaker
portanto a questão é essa como é que nós travamos seres humanos que reagem como um bebê de 3 meses estão com uma birra, gritam, gritam, gritam e partem do princípio que todos os seres à volta deles que têm que satisfazer aquela necessidade como se fossem o pai ou a mãe ou seja, dentro de um amor incondicional e perfeitamente disponível para satisfazer aquela necessidade quando não é isso que acontece
00:51:24
Speaker
Aqueles seres humanos estão de facto rodeados de seres adultos independentes que querem viver numa relação de paridade com eles.
00:51:31
Speaker
Como é que isto se faz?
00:51:33
Speaker
É isto que eu não sei.
00:51:38
Speaker
não há, eu pessoalmente não vejo muita, ou seja na ação de agora, eu sei como é que isto se pode prevenir, eu sei que temos que voltar a uma educação desde as escolas às famílias, à relação uns com os outros, eu sei como é que se pode trabalhar para recuperar
00:51:58
Speaker
Ou para trazer uma forma em que estas questões primárias não permaneçam assim até à adultícia e até à destruição do outro.
00:52:09
Speaker
Isso podemos pensar.
00:52:10
Speaker
Agora, como é que travamos isto?
00:52:13
Speaker
Não, é porque eu não acho que seja... Estava a pensar que...
00:52:18
Speaker
como eu não tenho esperança nenhuma na perversão como um lugar de saúde, acho que pronto, então por isso mesmo não me parece nada que seja por aí, ou seja, acho que a única hipótese que nós temos é continuar a irrigar e não deixar que este lado deste, como tu dizias me custa-me até por mas espera, até para não virar tudo ao contrário espera
00:52:37
Speaker
A mim parece-me que aquilo que nós temos que fazer é irrigar de vida e continuar a irrigar de vida todos os sítios que, de alguma maneira, essas pessoas tentam secar, não é?
00:52:48
Speaker
E não permitir, não permitir que esses lugares de desesperança dos quais se alimentam estas pessoas cujo poder...
00:52:56
Speaker
é utilizado para se manter, não poder até mesmo assecar as prensas do outro, o que nós temos que fazer é movimentos de saúde que continuem a irrigar de saúde tudo o resto que existe caso contrário não temos hipótese, se eu achar que vou perder para mim é mesmo isto, se eu achar que a solução está aí tentar transformar uma coisa desta envergadura numa coisa benigna mas é isso que já também gostei por isso eu estava a dizer isso é porque é assim, mas aquilo que tu estás a dizer é muito verdade não é?
Resistência e pensamento crítico contra influências negativas
00:53:44
Speaker
E leva com arrasamentos daquilo que nos faz mover, não é?
00:53:48
Speaker
Que nos dá vitalidade, que vocês estavam a dizer bem, desde sempre, é a relação com o outro.
00:53:52
Speaker
Se a relação com o outro se transforma neste lugar permanentemente, quer dizer, antes de dizer, uma pessoa para se levantar já está com um peso infinito.
00:53:58
Speaker
Agora, eu penso que uma coisa que a psicanálise nos tem ensinado sempre tão bem é esse peso enorme que tu estás a sentir não é teu, é destes que te querem pô-lo em cima.
00:54:06
Speaker
E, portanto, a devolução permanente deste lugar é o que nos pode safar.
00:54:11
Speaker
e eu acho que é esse o lugar caso contrário, é por isso que eu te digo eu não consigo mesmo ver saúde nenhuma na perversão como parece que é uma coisa seca que vive em função, que se tenta alimentar daquilo que é a humanidade se eu, a humanidade me deixar levar para aquela linguagem vou-me secando e passamos a ser nós miméticos daqui parece quase aqueles filmes dos ajuda-me dos como se chamam?
00:54:38
Speaker
Os mortos-vivos, não é?
00:54:39
Speaker
Que se vão alimentar dos vivos.
00:54:41
Speaker
Que se vão alimentar dos vivos para se manterem mortos e depois, às tantas, não é?
00:54:44
Speaker
Ou como o vampiro.
00:54:45
Speaker
É explicado que o vampiro fica-se do vampiro.
00:54:47
Speaker
E é isto que nós temos que ter imenso cuidado.
00:54:48
Speaker
Eu penso é que nós temos a obrigação de dizer isto cada vez mais alto.
00:54:52
Speaker
Virar isto ao contrário.
00:54:54
Speaker
Temos que virar isto ao contrário.
00:54:56
Speaker
Não é a ideia do... Ou seja... Mas tu percebeis que eu estou de acordo contigo.
00:55:01
Speaker
A questão é, Patrícia, como... Isso é verdade.
00:55:06
Speaker
As pessoas estão a sentir-se impotentes Por isso é que nós temos que lembrar que não estão
00:55:10
Speaker
Nós temos mesmo que fazer mostrar, fazer vingar isto.
00:55:13
Speaker
Não, as pessoas não estão impotentes.
00:55:14
Speaker
E este discurso diário não corresponde... As pessoas têm é que ter pensamento crítico para poder, na hora, tem que ser na hora, cortar a erva daninha.
00:55:22
Speaker
Porque senão a erva daninha vai pela cultura toda e não adianta ter saúde num terreno de tomates.
00:55:28
Speaker
Tu podes ter saúde num terreno de tomates.
00:55:29
Speaker
Se a erva daninha passar... E a questão é que é na hora.
00:55:33
Speaker
As pessoas têm que perceber que têm que ter pensamento crítico, ou seja...
00:55:38
Speaker
Tudo aquilo que possam ouvir do outro tem que tentar ter um juízo próprio, uma capacidade de raciocínio própria para perceber a ação que tem que ter na hora.
00:55:51
Speaker
perante essa pessoa, perante a afirmação que lhes foi dada, perante a situação em que estão, não interessa.
00:55:56
Speaker
Perante aquilo que as angustia, perante aquilo que as deixa para baixo, perante aquilo que as põe fora dos seus recursos naturais, não é?
00:56:10
Speaker
Eu acho que isso é muito importante, é nós transformarmos
00:56:15
Speaker
em recursos, em positividade, em capacidade, aquilo que afogenta e que destrói a capacidade das pessoas.
00:56:29
Speaker
Não é fácil, eu acho que é muito difícil, mas acho que é possível.
00:56:38
Speaker
Convidar, desafiar, levar as pessoas a pensar e a perceber que não têm grande alternativa.
00:56:47
Speaker
Ou vão à luta por aquilo em que acreditam e que faz sentido para si próprios, de acordo com a sua ética pessoal, ou então ficam quietos e subordinados por os outros que afirmam coisas e que arranjam, digamos assim, mecanismos para...
00:57:08
Speaker
sublimar, para submeter, para recalcar estas pessoas.
00:57:15
Speaker
Eu acho que é muito importante, de facto, esta mensagem de que é preciso acreditar e lutar por aquilo que são as convicções de cada um acordadas ou de acordo com a sua ética pessoal.
00:57:32
Speaker
E isto eu acho que é fundamental.
00:57:35
Speaker
porque efetivamente é uma área de transformação e de expressão que, nomeadamente, através das competências criativas que há pessoas que têm mais que outras, ou que nascem de acordo com a minha investigação e com aquilo que tenho
00:57:58
Speaker
investigado ao longo da vida, que nascem com maior disponibilidade para a criatividade, também conseguem expressar melhor e libertar-se melhor das tensões que existem dentro delas.
00:58:13
Speaker
E isto é muito importante.
00:58:17
Speaker
Estamos aqui a falar em dois planos, não é?
00:58:19
Speaker
Porque estamos a falar aqui no plano da luta diária, do dia-a-dia, dos encontros e desencontros que as pessoas têm, mas depois este trabalho pode ser feito na psicanálise, em ações de psicanálise e nas psicoterapias.
00:58:32
Speaker
E claro que quando de facto a pessoa sente que está à mercê dos outros e que não tem as rédeas da sua própria vida, pode sempre fazer uma psicanálise.
00:58:45
Speaker
E juntar-se à luta deste pensamento reflexivo e crítico e único, que é o meu e singular.
00:58:56
Speaker
Eu gostaria, se fosse possível, de partilhar agora aqui um poema último.
00:59:07
Speaker
Navegando, rio acima, rio abaixo.
00:59:11
Speaker
Fui percorrendo o caminho, amparada.
00:59:15
Speaker
Ora pelos sábios barqueiros, ora pelo próprio cais.
00:59:19
Speaker
Olho para mim e vejo-me na morada.
00:59:23
Speaker
ruídas as cordas da segurança, das barcaças que me têm conduzido, acho que é chegada a hora de balançar com minha própria embarcação.
00:59:34
Speaker
Ao mar, grande e assustador, que me envolve e me chama, que desejo, mas de que tenho muito medo.
00:59:45
Speaker
Medo de não meter barco para resistir, às investidas ferozes, às tempestades medonhas, ao trovejar ruizoso, ao conflito.
00:59:57
Speaker
Sempre sentidos em proteção pelas velhas amarras gastas, acreditadas, mas que também trazem, travam e prendem.
01:00:12
Speaker
Quis gritar e não podia.
01:00:14
Speaker
Quis nadar e não sabia.
01:00:17
Speaker
Quis soltar-me e não conseguia.
01:00:21
Speaker
Quis saltar e não sabia.
01:00:24
Speaker
Tulhida, amedrentada, mas esperançada, talvez pudesse aprender.
01:00:31
Speaker
Se encontrasse quem me ensinasse a reconstruir a barcaça e ao Ema Timonar.
01:00:37
Speaker
O tempo de aprendizagem acabou.
01:00:39
Speaker
Passagem com distinção.
01:00:41
Speaker
Vamos lá atimonar esta nova embarcação.
01:00:45
Speaker
Sei que é forte e resistente, que as marés não são suaves, que as ondas podem picar e os balanços baltear.
01:00:55
Speaker
Que a tempestade virá e a bonança a seguir.
01:00:59
Speaker
Assim a vida se levará até a morte a impedir.
01:01:03
Speaker
Só esta não é irreversível nesta viagem tão longa.
01:01:08
Speaker
Árdua, difícil, mas por isso via única para crescer.
01:01:13
Speaker
Há dor, há perda, o desvio do horizonte.
01:01:17
Speaker
São os riscos do ofício.
01:01:19
Speaker
Sem riscos não há emoção.
01:01:21
Speaker
Timoneiro, leva lá a tua embarcação.
01:01:25
Speaker
bem, excelente Cristina que boa forma de acabar com o poema da Cristina Nunes, a Presidente da Associação Portuguesa de Psicanálise e Psicoterapia Psicanalítica da qual nós todas fazemos parte e com muito gosto estamos todas aqui a conversar com a Cristina e
01:01:45
Speaker
Pronto, vamos terminar, não é?
01:01:48
Speaker
É. Portanto, muito obrigada Patrícia Câmara, muito obrigada Cristina Nunes, muito obrigada Carolina Pichel, que está aqui connosco sentadinha a fazer o nosso som, e muito obrigada à Climepsi por nos disponibilizar este material, e nós regressamos.
01:02:14
Speaker
I'm out of time Até para o mês que vem, um beijinho